Ao ouvir isso, levei um susto. Aos 39 anos, eu já tinha saído não só da casa de meus pais como de dois casamentos, e morado em dez endereços de quatro cidades em dois continentes. Era só no que os garotos de minha geração pensavam - jogar-se à vida, longe da saia materna ou da mesada paterna. Supunha-se que, enquanto se morasse com a família, estava-se dispensado da maturidade.
Um desses endereços, em 1967, foi o Solar da Fossa, um casarão colonial em Botafogo, perto do túnel Novo. Nele tinham ido parar rapazes e moças de fora e de dentro do Rio, todos em busca de liberdade para criar, trabalhar, namorar ou não fazer nada, enfim, viver. Ali, um dos moradores, Caetano Veloso, compôs "Alegria, Alegria"; outro, Paulinho da Viola, "Sinal Fechado". Grupos como o Momento 4, campeão dos festivais, e o Sá, Rodrix e Guarabyra se formaram em seus quartos.
Três de nossas lindas vizinhas estrelaram as páginas de "Fair play", a primeira revista masculina do Brasil: Betty Faria, Itala Nandi e Tania Scher. Paulo Leminsky escreveu seu romance "Catatau". O pessoal do Teatro Jovem, que estava revolucionando o teatro brasileiro, morava lá, assim como metade do elenco de "Roda Viva", em ensaio no outro lado do túnel. Os namoros eram a mil. Até o autor francês Jean Genet, de passagem pelo Solar, se enrabichou por um dos nossos.
Se aquela turma morasse com a mãe, nada disso teria acontecido.
Folha de São Paulo - 30 de Julho de 2011 - A2
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